Baixa Visão e Alta Curiosidade

retângulo verde com textos em preto e foto de Anderson Dall Agnol

É muito comum eu estar estudando, lendo ou assistindo a algo em locais públicos (bibliotecas, cafés, estações de ônibus) e, por estar próximo ao smartphone, as pessoas me perguntarem: “Você tem uma dificuldade/problema de visão?”. Digo que sou uma pessoa com baixa visão e então elas questionam: “O que é a baixa visão?”, “Como você enxerga?”, “Você vê embaçado?”.

Vivemos em uma sociedade preconceituosa e capacitista. Fato. Mas, penso que a maioria das falas que escuto é mais um desconhecimento do que maldade.

As pessoas com baixa visão como eu são aquelas que apresentam algum resíduo visual (entre 5% e 30%). Mas, a forma como cada um de nós enxerga é particular. Pessoas podem enxergar o mundo de maneiras totalmente diferentes mesmo possuindo a mesma porcentagem de visão. Algumas pessoas com baixa visão conseguem ler textos com fontes grandes ou com o uso de lupas, enquanto outras conseguem apenas detectar grandes formas, cores ou contrastes.

Há muita curiosidade também em relação a outros aspectos da vida da pessoa com baixa visão: “Como você estuda?, “Como você trabalha?”. Apesar de algumas pessoas pensarem ser difícil estudar, trabalhar e viver com essa deficiência, levo uma vida bem corrida e atribulada. Costumo explicar que sou uma pessoa com deficiência que trabalha, estuda, se diverte e leva uma vida comum, pois os recursos da tecnologia ajudam e muito. “Sério? Como você faz para utilizar o computador e o celular?”. Basicamente, igual a qualquer outra pessoa, só que com ajuda de tecnologias assistivas. Sempre estou com algum dispositivo em mãos, seja meu smartphone, notebook ou leitor de livro digital (e-reader). Todos eles possuem várias opções e ferramentas de acessibilidade que permitem: utilizar uma lupa eletrônica; mudar o tamanho, o tipo e a cor da fonte; mudar o espaçamento entre linhas; remover anúncios e publicidades em páginas da internet (ufa!); dentre outras configurações que facilitam o consumo de conteúdo digital.

“Então é só conseguir essas ferramentas que você consegue fazer tudo?”

Quase tudo. Além dos recursos presentes nos dispositivos, existe um outro tipo de acessibilidade tão importante quanto. Refiro-me à acessibilidade atitudinal. Neste sentido, profissionais que trabalham com conteúdo no meio digital devem fazer também a sua parte. A tecnologia assistiva está aí disponível e é muito útil. Mas depende do fator humano para que, de fato exista acessibilidade nos sites, portais, sistemas, aplicativos, documentos e materiais. Conteudistas do meio digital precisam seguir um conjunto de regras que garantem que todos possam acessar, navegar, compreender e interagir com o artefato. Tudo com autonomia e segurança.

Aqui vão algumas dicas sem quaisquer custos que podem ser adotadas a partir de hoje em conteúdos digitais para facilitar a vida das pessoas com deficiência visual/baixa visão:

  1. não use fontes decoradas, rebuscadas ou com serifa (prolongamentos no fim das hastes dos caracteres). As fontes serifadas, são recursos estéticos que podem atrapalhar (e muito) a leitura por parte de pessoas com baixa visão, pois parecem estarem unidas. Nesse caso, é importante utilizar fontes como Arial, Verdana, Calibri ou Helvética;
  2. faça uso de maiúsculas apenas quando necessário. Textos escritos todo em maiúscula podem dificultar a visualização e leitura por usuários com baixa visão;
  3. procure evitar o uso de textos que aparecem todo em negrito ou itálico, pois podem dificultar a leitura de usuários com baixa visão;
  4. garanta um bom espaçamento entre as linhas do texto, garantindo a legibilidade do conteúdo;
  5. ofereça sempre uma boa relação de contraste entre texto e fundo. Uma dica que pode auxiliar é empregar letras claras em um fundo escuro ou letras escuras em um fundo claro;
  6. não use botões ou imagens com dimensões muito pequenas, pois podem ser de difícil identificação por pessoas que apresentam menor resíduo visual.

Geralmente após uma conversa dessas que mencionei, as pessoas me pedem desculpas por terem perguntado tanto, agradecem por terem aprendido e dizem que vão pesquisar mais. Nestas horas, eu até relembro das inúmeras vezes que essa enorme quantidade de perguntas me incomodava ou até irritava. Hoje, percebo que é apenas curiosidade e desinformação. E que momentos como esse são fundamentais para que a sociedade tenha a oportunidade de enxergar as diferenças e entender um pouco mais sobre deficiência, acessibilidade e diversidade.

Anderson Dall Agnol é assistente em administração no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS). É graduado em Tecnologia em Logística pelo IFRS Campus Bento Gonçalves, com especialização em Comunicação em Marketing em Mídias Digitais pela Faculdade Estácio do Rio Grande do Sul (FARGS) e Mestrado em Informática na Educação pelo IFRS Campus Porto Alegre.