O que é acessibilidade, o que significa tê-la e qual o impacto disso?
Você sabia que a palavra acessibilidade significa facilidade de acesso; qualidade do que é acessível; facilidade de aproximação, de procedimento ou obtenção?
Refletindo sobre seu significado, a primeira imagem que tenho são de assuntos relacionados às Pessoas com Deficiência (PcDs), mas posso considerar também as pessoas sem deficiência, pois ter acesso para mim é um direito universal: saúde, moradia, estudos, tecnologia e o que contempla. Infelizmente essa não é a realidade da maioria das pessoas e quando há pessoas com alguma das classificações de deficiência, a problemática aumenta.
Você sabia que há muitas pessoas com deficiência que não conseguem sequer sair de casa porque há obstáculos estruturais como escadas, por exemplo, ou porque o transporte público não tem plataformas? Essa foi minha realidade quando adquiri minha cadeira de rodas com 11 anos de idade. E foi só após meus pais conseguirem comprar um carro Del Rey que eu tive o privilégio e a chance de voltar a estudar.
Segundo matéria de “O Globo”, são cerca de 1,115 milhões de alunos com deficiência matriculados em turmas regulares entre 2011 a 2020, mas a acessibilidade continua sendo um desafio. Não são só rampas, banheiros e mesas que são necessárias, mas sim profissionais capacitados para praticar a inclusão. Um exemplo que compartilho é o de quando estava na faculdade. Relatei a falta de bebedouros acessíveis e de uma plataforma para que eu pudesse ter acesso à bancada do laboratório. E a atitude da reitoria foi a de me ouvir e providenciar as adaptações necessárias.
Para ingressar no mercado de trabalho, os obstáculos continuam. De acordo com o Governo Federal do Brasil, apenas cerca de 372 mil PcDs estão empregados no mercado formal (do total de 17 milhões de pessoas com deficiência, de acordo com o IBGE). A Lei de Cotas foi de importância fundamental para inserção nas empresas. Porém, não houve muito conteúdo em adaptar os espaços arquitetônicos ou mesmo softwares de acessibilidade. Não houve preparação das pessoas para receber esses profissionais e não foi desenhado um plano de desenvolvimento individual, mentorias, ou mesmo o planejamento de carreira. Isso pode reforçar estereótipos e preconceitos e gerar um sentimento de exclusão social e falta de oportunidade profissional.
Qual impacto a sociedade tem? Trabalho e Turismo e como mercado ativo.
Através da informação podemos mudar o pensamento das pessoas para melhor. No começo, PcDs eram convidados a ficar em casa, isolados do convívio social. Mas com a acessibilidade, hoje vemos muitas pessoas convivendo em locais públicos, viajando e interagindo com outras pessoas.
Tenho uma amiga que mora no litoral e, todas as vezes que íamos até lá, o desafio sempre era a areia fofa. Pessoas me ajudavam a passar por esse obstáculo porque não havia acesso. Vencido esse obstáculo, eu aproveitava para me conectar com pessoas. Muitas vezes pude contar como poderia melhorar, ou seja, compartilhava meu conhecimento e ajudava a levar acessibilidade àquele local.
Não demorou para que o mercado do turismo identificasse esses clientes e, de acordo com o site Passaporte Acessível, nos Estados Unidos entre 2018 e 2019, PcDs investiram em viagens e passeios a quantia de 58,7 bilhões de dólares.
O Cristo Redentor ainda é um dos passeio mais procurados por PcDs no Brasil, mas te convido a pensar nos esporte de aventura seja por terra, ar ou água. Sou uma das responsáveis pela Comissão de Espeleoinclusão da Sociedade Brasileira de Espeleologia, que já avaliou mais de 10 cavernas e parques para garantir a acessibilidade e o treinamento de pessoas para receber PcDs.
Qual o impacto da tecnologia quando o tema é acessibilidade?
Quando eu pensava em tecnologia quando criança sempre me vinha à cabeça “Stars Wars”. Anos mais tarde, entendi que é através da tecnologia que pude me locomover na cadeira de rodas e me colocar em igualdade no direito de ir e vir. E vieram os carros adaptados, cadeiras automáticas, os aparelhos auditivos e implantes cocleares, as próteses, órteses, os óculos, exoesqueletos, talheres articulados para pessoas que não tem o tato fino. Tudo através de tecnologia e inovação.
Ainda estamos lutando para que os sites sejam acessíveis e há varias ferramentas disponíveis hoje como Equalweb e HandTalk. Temos ainda aplicativos como Voiceover, Biomob, Be My Eyes e BlindSquare que possibilitam a leitura e solicitação de ajuda.
Trabalho na Oracle do Brasil e várias adaptações têm sido feitas de acordo com as necessidades de PcDs, como a implementação de portas automáticas em todos os andares e o elevador de acesso ao 13º andar, onde fica um lindo rooftop. Isso tudo através de um trabalho conjunto entre PcDs, o time de D&I, RH e Facilities, com apoio incondicional da liderança.
A tecnologia beneficia de maneira gigantesca as pessoas com deficiência, proporcionando qualidade de vida, o direito de ir e vir, independência e a sensação de liberdade.
Use o seu privilégio e seja um aliado
Se não fosse minha família, meus amigos e os aliados, eu não sei se teria o privilégio de estar onde estou hoje. Foram muitos obstáculos, muitos “nãos”, muitas dúvidas sobre minhas capacidade e meu futuro. Mas eu tinha (e tenho) aliados que não me deixam perder o propósito. Pense em atitudes que podem promover a acessibilidade como indicar um restaurante que você frequenta e que tenha um banheiro adaptado, usar qualquer um dos aplicativos citados acima, compartilhar seus aprendizados naquela conversa com os amigos ou intervir na piada que pode ser ofensiva para uma pessoa com deficiência. Você pode indicar para a liderança da sua empresa que, na agenda, haja um espaço aberto para conhecer esses pilares. Permita-se abrir seu networking com PcDs, LGBTQIA+, Mulheres, Gerações, Raça e Etnia.
No fim do dia, somos pessoas com um potencial enorme para fazer desse mundo um lugar ainda melhor e não podemos ignorar que pessoas e empresas com times diversos têm um desempenho acima do esperado!!
Érica Nunes é líder voluntária na Oracle do pilar Oracle Diverse Abilities Network (ODAN) no Brasil, que valoriza também as habilidades diversas das pessoas. Coordenadora da Comissão de Espeleoinclusão da Sociedade Brasileira de Espeleologia (SBE). Formada na Universidade Metodista de São Paulo em Biomedicina e na Fundação Vanzolini fez Capacitação em Gestão da Qualidade e Processo. Desde a adolescência, atua nas questões sobre acessibilidade e inclusão voltado para pessoas com deficiência.